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Vampirismo na Quimbanda



Quem não pode com mandinga não carrega patuá. Esse ditado tradicional da cabalá crioula expressa bem o tema que agora abordaremos nessa reflexão, pois os mortos têm fome e caso o kimbanda não dê conta de honrar seus juramentos de iniciação, então àquela tecnologia construída para ele com a finalidade de vitalizar a sua alma, passa a drenar completamente as suas energias.


Muitos têm solicitado que eu aborde a questão das ações vampíricas de Exu e Pombagira na Quimbanda, na relação que se estabelece entre o Exu tutelar e seu adepto. Mas antes de adentrar ao tema, vamos refletir no que tecnicamente é o vampirismo: feiticeiros com a capacidade de se alimentar ou consumir a força vital de outras pessoas, de uma egrégora ou ambiente, são conhecidos como vampiros. Isso é chamado de espiritualidade predatória, quer dizer, a ação ritual de cercar e consumir a força vital para o seu próprio crescimento. Feiticeiros assim absorvem e drenam a força vital de outras fontes através de feitiços, por meio da ação de algum Exu, égún ou kiumba, e até mesmo por meio dos sonhos. Em outras palavras, a espiritualidade predatória é o ato de devorar a força vital para tornar-se mais forte, e a isso damos o nome técnico de vampirismo.


Adeptos de Exu Morcego, um espírito com amplo conhecimento de feitiçaria das sombras, acabam por desenvolver essa capacidade: enriquecer sua própria força vital por meio do dreno da vitalidade de outras pessoas. O vampirismo é uma prática de feitiçaria, uma técnica para evocar e dirigir forças sombrias poderosas com a finalidade de penetrar o veículo pneumático da alma e drenar toda sua vitalidade.


Não existe Quimbanda sem sangue; o sacrifício, a imolação de um animal para honrar Exu e Pombagira, é o eixo teúrgico da Quimbanda e de seu ofício sagrado advém os fenômenos mediúnicos mais importantes. Ocorre um processo alquímico profundo na alma durante o sacrifício; essa alquimia é tão poderosa que liberta o kimbanda de ações alienadas e submissas no mundo, despertando poderes predatórios em seu interior que o acordam para a verdadeira realidade da natureza.


O sangue carrega todo potencial de vida e de ancestralidade; por esse motivo ele é tido como elemento essencial e valioso na nutrição de Exu e Pombagira. Ao passar pela cerimônia do batismo, o adepto recém-iniciado recebe um vulto de seu Exu tutelar, uma firmeza como um pequeno bebê que acaba de nascer. Esse vulto é nutrido com força vital até que cresça e se torne um assentamento definitivo para o espírito com o tempo. O assentamento é uma tecnologia de comunicação com o Exu tutelar e nele será vertida a seiva vermelha para que ele possa adquirir vida. Isso significa que o Exu precisa ser nutrido para ganhar força e, no tempo certo de amadurecimento, devolver ao adepto a força vital que nele é depositada. Essa é a verdadeira aliança que o kimbanda estabelece com seu Exu tutelar. O sangue não só verte vida no assentamento e energiza o Exu, ele também estabelece uma conexão profunda entre ambos: sangue é uma poderosa fonte de energia para romper as barreiras entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos. Através do sacrifício o adepto se aproxima mais e refina sua comunicação com o Exu tutelar.


A partir do momento que o adepto começa a oscilar demonstrando inaptidão em sua jornada na Quimbanda, negligenciando seu juramento e compromissos assumidos com Exu, então o assentamento, o fons vitae que provê sustento ao kimbanda, torna-se um buraco negro. É a vitalidade exclusiva do adepto que passará a sustentar a aliança entre ele e o Exu tutelar: sangue por sangue, vida por vida. A cada sacrifício de sangue vertido no assentamento de Exu renova os laços entre ambos, construindo um equilíbrio harmônico de crescimento e prosperidade. A libação, uma ferramenta sacerdotal de sacrifício aos deuses tão antiga quanto o próprio homem, é uma das práticas fundamentais na relação que se estabelece entre o Exu e seu adepto para harmonização da força vital compartilhada por ambos. Existe um entendimento universal no pensamento religioso da Antiguidade e que sobreviveu nas tradições africanas, de que alimentando a terra (ancestralidade) com sangue, ela nos devolve com vitalidade, renovação e prosperidade.


Uma sabedoria que vem de Exu Sete Catacumbas: você faz ou você não faz; você confia ou você não confia. Isso significa que não existem meios termos na relação que se estabelece com Exu. Então, quem não pode com mandinga não carrega patuá.


Táta Nganga Kimbanda Kamuxinzela

Cova de Cipriano Feiticeiro

Templo de Quimbanda Maioral Exu Pantera Negra e Pombagira Dama da Noite

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